sábado, 6 de agosto de 2011

CLARA, PLANTINHA DO SENHOR

"Salve Santa Clara, mulher admirável, religiosa modelar, mãe admirável, plantinha do nosso pai São Francisco. Clara de nome, preclara pelas virtudes, ilumina-nos no discipulado da altíssima pobreza".


            Há figuras que se deixam tocar pela mística transformante do autêntico amor, tornando-se cada dia melhores para melhorar o mundo em torno de si. Por entre elas, realmente sábias e santas, encontramos a figura fascinante de Clara de Assis. Pode-se dizer que ela foi humana, demasiadamente humana, e por isso soube compreender o Criador e a criatura.
Clara de Assis nasceu na Idade Média e a mulher nesse período não é dotada de autonomia. Era colocada sob o domínio do homem. Paradoxal é a atitude da sociedade da época com relação à mulher: de um lado o mistificador, fazendo dela um ser inacessível, a dama pela qual o cavaleiro enfrenta duelos mortais e de quem aspirava receber o louro da vitória, exaltação do eterno feminino, de massacrar um verdadeiro machismo. Por outro lado, era um tesouro frágil, irresponsável, incapaz de fortaleza.
            A figura de Clara encanta e ilumina. Isso porque traz a marca de uma profundidade e de um equilíbrio grandiosos. Ela demonstra ser, desde muito jovem, uma mulher firme e decidida - basta-nos ler o Processo de Canonização e o seu Testamento. A determinação com a qual enfrente oposições à sua decisão, e posteriormente ao seu ideal de pobreza absoluta, define estes traços de firmeza e decisão de sua personalidade. Acima de tudo, mostra em si a dinâmica de quem sabe envolver atitudes radicais numa serenidade constante e comovente, advinda de sua objetividade, clareza, realismo e linearidade de ideias. Segundo Zilda Ribeiro, "em sua feminilidade autêntica, bonita e elegante, possuidora de uma sensibilidade profunda, soube crescer em maturidade psicológica, integrando a radicalidade do amor a Deus com as mais puras expressões do puro amor humano"[1].
            Clara não é mulher de um vasto campo, confuso e complexo, de ideias. Ao contrário, seu pensamento é límpido, profundo, original, incisivo. Sua vocação era seguir a Cristo. Percebe, talvez de maneira confusa, que aspirava pela verdade, que queria a vida e plenitude, precisava descobrir o caminho e pressentia que tudo se encontrava no Evangelho. Mas como fazer, para onde ir? Pelas ruas de Assis via caminhando e cantando o filho de Bernadone, antes , jovem coberto de riquezas e vivendo festas mundanas, agora amigo dos leprosos, penitente e profundamente feliz. Segundo a irmã Maria Bernada, Clarissa Capuchinha, "Clara reconhece na vocação de Francisco sua própria vocação. Percebe essa simplicidade que a permite ir ao encontro com Deus, o Deus de Bondade, amabilidade e amor. - continua a irmã-, deve-se dizer que a vocação de Clara foi específica, não mero reflexo da vocação de Francisco, vocação esta, pela qual lutou por quase vinte e sete anos sozinha, depois da morte do Santo"[2]
            Não há dúvidas que a vida da santa foi cheias de luta. No seio de uma Igreja e de uma sociedade com seus profundos desafios, Clara deixou um vivo testemunho de alguém que opta pelo essencial, que faz mudança de lugar social e se coloca entre os pequenos, vivendo como eles. Assim, lembro-me da música franciscana que diz:

Clara, ó Clara, me diga por quê
Que foi que Francisco falou pra você
Clara, ó Clara, eu quero entender
Porque deste mundo te foste esconder?

Tu tinhas dinheiro, vivias feliz, igual às
Meninas que havia em Assis.
Será que Francisco te enfeitiçou
Que tão de repente teu mundo mudou?

Eu tinha dinheiro, vivia feliz,
Igual as meninas que havia em Assis.
Mas foi Jesus Cristo que me cativou
Francisco somente o caminho mostrou.

Eras bonita, de classe maior
Teu pai era nobre e senhor
Será que esta vida não era viver
Que tão de repente te foste esconder?

Eu era bonita de classe maior
Mas eu tinha sonhos de algo melhor
Será que esta vida é viver e morrer?
Um dia por fim, eu parti, fui viver.

Deixaste o dinheiro, tranquila e feliz
E foste viver num mosteiro de Assis
Será que perdeste a razão de viver
Tão jovem, tão bela, não dá pra entender?

Deixei o dinheiro, tranquila e feliz
E fui me trancar num mosteiro de Assis
Deixei o que eu tinha, passe a viver
Que a vida é bem mais que a mania de ter

Clara, ó Clara, já posso entender
Porque deste mundo te foste esconder


[1] RIBEIRO, Zilda. O Feminismo na modernidade. Cadernos Franciscanos: Franciscanas falam de feminismo. Nº4. Petrópolis: 1993. p. 47-48.
[2] BERNADA, Maria. Clara e a vocação franciscana. Cadernos Franciscanos: Clara e o Carisma franciscano. nº 7. Petrópolis: 1992, p. 12-15.

 Ramires James Moscardo

Um comentário:

  1. Boa noite, Capuchinhos!
    Paz e Bem!!

    Que belo texto você nos apresenta, Ramires!!! Deixa para trás aquela moça meramente encantadora e seguidora do Francisco.
    Clara foi muito além do seu tempo e espaço... Mulher que não precisou embrutecer-se, num mundo machista, para mostrar a força que o feminino carrega em si. Sua coragem e determinação, atributos então do vigor masculino, nascem do Amor que de si transborda e se faz ação no cuidado para com o outro.
    Clara é a pura expressão do amar a Deus que se faz necessariamente presente no amor ao irmão.
    Quero te conhecer, Clara de Assis!!!

    Abraço fraterno,
    Ariane Zoby

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