segunda-feira, 25 de abril de 2011

Histórias de ressurreição

Ele não está aqui; ressuscitou!


E dizem que o mundo nunca mais foi o mesmo... “Por que procurais entre os mortos aquele que vive? Ele não está aqui; ressuscitou” (Lc 24,5-6).

Numa pequena cidade do interior paulista, encontrei-me com uma jovem, de nome plural, alma cinza e colorida. Foi me dizendo algo assim: “Moço, viste o amado da minha alma?” O cheiro de dor estava por todo o canto. O seu rosto trazia as marcas do sofrimento, sua angústia transformara-se no grande drama humano, trazia nas dobras de seu coração os traços da paixão e morte.

O comentário geral, no pequeno vilarejo, era a respeito de um homem, poderoso nas palavras e forte no amor. Ele havia sido assassinado na cruz, alguns achavam que Ele poderia ser a manhã que não conhece o ocaso, mas já fazia três dias que a semente havia sido enterrada.

Diziam que Ele era inocente. Um profeta, que acreditava em sua mensagem, disse que “foi levado ao matadouro, como cordeiro, não abriu a boca. Diante dele a gente vira o rosto”. Foi abandonado por todos os seus amigos, resta-lhe apenas o consolo de algumas mulheres e o de sua mãe, afinal, tudo pode faltar menos o amor de mãe.

Num estralar de dedos aquela jovem fitou-me. Percebi que ela tentava sorrir para o sol, que era belo, radiante e forte. Porém faltava a seus olhos a fome da beleza. Na sombra de sua face habitavam legiões demoníacas. Não conseguia suportar o real, enfeitava a vida com flores de velório.

De um lado ao outro, notei o desfile de almas vazias. Sacolas cheias de chocolates, presentes; comércio e supermercados com as portas levantadas. Era feriado no dia seguinte precisavam aumentar o lucro. O consumismo-capitalismo invade também o interior das pessoas.

Resolvi andar, precisava conhecer melhor a cidade, visitar seus pontos turísticos. Já cansado do passeio, com meus pensamentos cheirando sangue, parei-me na porta do cemitério, era famoso porque sobre suas gramas repousavam ilustres poetas.

Novamente, ouvi uma voz fina e suave a me dizer: “Moço, viste o amado da minha alma?”.

Os ossos sofrem, mas ela se cala. Sabe que o amor é mais forte que a morte. Outra vez o silêncio toma conta do nosso encontro. Ela muito amou, é isso, vive a “loucura do amor”, sofismei.

A alguns metros eu escutava numa rodinha uma grande discussão. Alguns diziam: “Ah Ele é conhecido’. Outros completavam: “Por amor é que foi condenado”.

Ninguém sabia quais foram os crimes que cometera. Alguém podia lhe apontar um ou dois pecados? É, parece que Ele mexeu com os poderosos, aqueles que fazem de suas relações uma teia de interesses e privilégios são perigosos. Não houve por aqui alguém que pudesse amar do jeito que Ele amou, remendou alguém.

Encantou a todos, crianças, jovens e velhos. Jantou com a d. Maria, tomou um bom vinho com seu José, abençoou seu jovem irmão- lembrava seu Carlos. Foi ao poço, na montanha, no sítio, olhava nos olhos, abraçava, beijava, tirava leite das vacas. Ele estava em todos os lugares. Morreu. Assassinaram o Amor que só sabia amar, pontuou.

Um velho político lembrou: “Política é a arte de fazer acordos”. Tramaram e fizeram o tal acordo. Ele disse que é Deus, nosso Deus é Washington, Ele deve morrer.

Voltei meu olhar para aquela moça. Eu não sei bem, mas ela tinha algo especial. A noite chegara, resolvi por ali descansar o corpo. As horas passaram-se. Era de madrugada, a jovem correra para o túmulo. Alguns diziam: “ela está louca”. Não se importava, corria mais depressa, tinha a nobre certeza de que encontraria o seu Amado.

Ao lado do grande parque de diversão, notou que a pedra do túmulo estava removida. Achando que fosse o jardineiro me olhou novamente e bradou: “Eu sei que você sabe dele, por favor, não quero mais sofrer, me fale, me fale, onde você o colocou? Vou buscá-lo”.

A aurora estava perfumada. O céu se enfeitara como em noites de núpcias. A estrela da manhã resplandecia ternura e vigor. De repente eu ouvi outra voz, serena e forte, fiquei arrepiado e me calei: Mulher, por que procurais entre os mortos aquele que vive? Ele não está aqui; ressuscitou”.

“Levanta-te, minha amada, formosa minha, vem a mim! Naquele momento, de forma solene, professei minha fé. Sim, Jesus está vivo. Ressuscitou da morte. Curou o coração humano das cruzes, mortes e maldições. O amor venceu! Venceu o amor! “Frente à loucura dos homens, vive a loucura do amor”. É páscoa, passagem, Ele vive com a gente. Agora podemos cantar o grande Aleluia. Não há mais por que chorar, o Amado de nossa vida traz em suas mãos os sinais da vitória.

Ao leitor desejo uma feliz e santa Páscoa na alegria da ressurreição do Senhor. Rezo por você. Faça o mesmo por mim.



Leandro, franciscano pecador e sonhador.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

O serviço da portaria : um ministério da acolhida.

" Aonde mandar eu irei, seu amor, eu não posso ocultar. Quero anunciar, para o mundo ouvir, que Jesus é nosso Salvador."[1]

Refletindo sobre a experiência de serviço na portaria do Colégio, e interpretando- a em chave evangélico testemunhal, o vivido o conteúdo experiencial no sentido de dado vivêncial, evocando o tema da experiência individual, mas também comunitária seja ela de trabalho, da simplicidade e sobretudo, da interioridade do sujeito que na dinâmica humano-espiritual procura perceber a mão de Deus, nos momentos mais ordinários e comuns do cotidiano, e busca colher na simplicidade dos fatos corriqueirosa e na gratuidade das relações cotidianas os elementos para alimentar sua vida interior e percebendo um sentido mais profundo dessa experiência e os frutos de bençãos de Deus que irrigam o chão da vida cada momento por pura graça que Deus nós dá continuamente Ele que é o Sumo Bem e dele vêm todo o Bem. As flores que colhemos desse jardim são plena gratuidade do Criador. E o trabalho é uma graça que a sua bondade nos permite no exercício do serviço esses anos como porteiro no Colegio Internacional São Lourenço de Brindis, Roma, percebo o proveito particular, mas também comunitário.

Na realidade latino-americana com toda necessidade que temos de pessoas para a pastoral e contribuir ativamente missão da Igreja, pode não fazer sentido se dedicar a um trabalho em ambito doméstico como o serviço da portaria. Para um religioso pode ser um reducionismo, visto que é um a menos para a pastoral em favor de exercer um serviço que poderia ser feito por qualquer outra pessoa sem a necessidade que ela fosse consagrada para exercer esse serviço. Ali está o desafio fazer o que todos podem fazer, o trabalho simples e comum que não necessita de muita instrução. Mas o cristão deve entender que o melhor lugar do mundo é onde Deus quer e não onde gostaríamos de estar.

A escolha de como usar a liberdade deve ser motivada com valores que respondam ao ideal de seguir adiante fiel ao compromisso assumido. Pessoalmente busco sempre as motivações para seguir adiante no meu trabalho, é fácil fazer um trabalho que te faz sentir bem, no qual recebe beneficios e vê os resultados, ou que os outros te fazem ver. Fazer um trabalho onde humanamente não se percebe nenhuma realização e que mesmo que tenhas trabalhado todo o dia e estejas muito cansado parece que não fizestes nada todo o dia. Nesse ponto que chega um momento que as motivações simplesmente humanas no nível da realização não correspondem.

Estudando a história da nossa Ordem é interessante encontrar na maioria das províncias a figura do capuchinho popular que está no meio do povo, se deve em parte aos capuchinhos que faziam a pregacão popular e serviços pastorais, mas a santidade e a compartilhada com as pessoas no cotidiano, mas tambem os sofrimentos dos simples e dos pobres.

Se olhamos para os nossos santos capuchinhos entre eles temos uma diversidade seja o mártir São Fidélis, que os que se dedicaram, sobretudo, ao sacramento da penitência como São Lepoldo e São Pio da Pietralcina, entre outros. Mas a grande maioria dos santos canonizados de nossa Ordem, como a maioria dos frades com fama de santidade na sua maioria são esmoleiros ou porteiros. Olhando para os canonizados temos a simpática figura de São Félix de Cantalício, irmão leigo simples e esmoler, e outros que seguiram na mesma estrada como São Crispim de Viterbo, São Félix da Nicosia, São Francisco de Camporosso ou o Beato Leopoldo de Alpandeire que fizeram serviço como esmoleiros, e São Conrado de Pazham que é o santo patrono dos porteiros da Ordem Capuchinha. Ele enfrentou com fidelidade ao dever e paciencia o serviço da portaria por quarenta anos, servindo seja os frades do convento como os pobres que batiam a porta do santúario de Altötting.

Atualmente algumas virtudes consideradas para o bom irmão religioso podem parecer superadas, no passado a maioria dos irmãos fazia os trabalhos manuais era também uma situação conjuntural, e como propunha a mentalidade da época o modelo de santidade era a lealdade e o bom cumprimento dos deveres estabelecidos de modo mais perfeito possível. Hoje estamos em outros tempos, mas honrar os compromissos e cumprir os deveres é atual para cada frade independente do serviço que faça.

As virtudes do bom porteiro além de ser fiel aos seus deveres, está entre elas o deve ter muita paciência, ser prontos a acolher a todos já na tradição beneditina, o Pai dos monges do Ocidente na sua Regra coloca como essencial para um porteiro que seja um religioso de uma certa experiência, e que saiba defender o ambiente claustral das pessoas que queiram se intrometer na vida do convento, mas que seja discreto e sábio, e pronto a acolher e responder a quem chegar.[2] Seguindo as normas já estabelecidas pela regra beneditina outras Ordens como a Dominicana, estabelecerá certas qualidades para o serviço de porteiro. A tradição franciscana primitiva não estabelecerá já que os primeiros frades não tinham nem convento, mas para mim um critério serve para também para os porteiros, ser um bom exemplo, ser simples e discreto mesmo quando deve administrar situações delicadas.

Ainda seguindo a escola franciscana se aplica ao porteiro o que vale para todos os frades seguir o Cristo bom pastor e ter atitude de acolhida de todos e cuidado pelo ambiente e pelos irmãos.[3] O porteiro é o ministro das relações externas do convento é ele quem apresenta a cara da fraternidade local e ao mesmo tempo é ele a sentinela que defende o convento das pessoas externas que tentam tumultuar o convento.

Como para qualquer pastoral ou serviço que se exercer na provincia ou na Ordem é necessário centrar-se no exemplo de Cristo que é o primeiro irmão menor, a acolhida é necessário e essencial e o respeito pelas pessoas.[4]

De outra parte hoje estar disponível a fazer um serviço como o de porteiro é escolher um serviço humilde e escondido, onde nem sempre as pessoas sabem aquilo que você faz. Cada momento é necessário ter presente o modelo de Cristo, humilde, pobre casto e obediente ao Pai[5].

Depois de alguns anos exercendo esse serviço constato algumas coisas que nem sempre é fácil ter diante dos olhos o exemplo de Cristo, na minoridade e na paciência é constante a tentação de irritar-se. A rotina cotidiana é que causa stress, porque nem sempre é fácil adapatar-se para vencer a rotina. Nem sempre todas as motivações bastam para perseverar no objetivo que deve seguir.

È necessario colocar sempre diante dos olhos o espelho de Cristo[6] modelo ao qual somos chamados a conformar-nos para viver a intimidade da vida intra-trinitária. A oração constante rezando com a vida oferecendo os êxitos e felicidades, mas principalmente as caidas e as dificuldades. O sustento da fraternidade contando com o diálogo e da acolhida do dom que tens a consciencia de ser para a fraternidade e para a Ordem e aprender a acolher o outro com as riquezas que ele te oferece.

Uma das coisas importantes é ter consciências que nos temos valor pelo que somos e não somente por aquilo que fazemos, principalmente nos que somos chamados a ser menores no nome Ordem dos Frades Menores[7], mas principalmente de fato, devemos estar no caminho certo colocando toda a nossa pessoa nas coisas que podem parecem sem importância e sem valor, nas coisas mais simples. Porém, na maioria das vezes não é fácil controlar o nosso desejo de ser e de fazer coisas importantes.

Frei Emerson Aparecido Rodrigues, frade menor capuchinho.

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[1] Música de Adriana: Essa é a nossa missão.
[2] Regra São Bento Cap LXVI, os porteiros do mosteiro.
[3] Adm VI
[4] Cfr. Sl 22, Jo 10, 1-18.
[5] RB I, 1
[6] 3 CtIn 12-14
[7] RNB VII